TRT 13 decide: Pesquisadora com síndrome de encarceramento terá direito a teletrabalho

Uma pesquisadora portadora de uma rara deficiência motora que trabalha no Hospital Universitário Lauro Wanderley, em João Pessoa, conseguiu na Justiça do Trabalho da Paraíba o direito ao teletrabalho de forma definitiva. Trata-se de uma premiada farmacêutica portadora da síndrome de Locked-In (ou síndrome do encarceramento), doença cujas consequências a deixaram tetraplégica e muda, com total dependência de uma cuidadora para desenvolver as suas atividades no local de trabalho. A decisão da Segunda Turma de Julgamento do TRT da Paraíba foi unânime.

A ação foi movida contra a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), vinculada ao Ministério da Educação e responsável pela gestão do HU, e teve ganho de causa no juízo originário, levando a empresa gestora a recorrer ao TRT 13. A autora é pós-graduada, com doutorado na área de farmácia.
A Segunda Turma acatou a decisão do juízo originário, que deu ganho de causa à farmacêutica, lembrando, na fundamentação, que a reclamante foi aprovada em concurso público realizado em 2014, sendo admitida em 1º de setembro de 2015 em vaga exatamente destinada à portadora de necessidades especiais. “É injustificável o fato de a empresa ré, após mais de 5 anos de relação de emprego, ainda não ter proporcionado ambiente de trabalho digno e adequado às necessidades específicas da profissional, principalmente quanto às instalações sanitárias, que devem atender aos requisitos previstos nas normas técnicas da ABNT (NBR 9050), como necessidade de espaço interno que permita um giro da cadeira de 360º e torneiras que devem ser acionadas por alavancas ou sensores eletrônicos, dentre outras, não sendo o caso do banheiro mostrado nas fotos apresentadas pela demandada”.

Abuso de direito
Embora a CLT trate da necessidade de mútuo acordo entre as partes para a adoção do regime de teletrabalho, o caso da farmacêutica traz a peculiaridade da deficiência física. “Registre-se que o art. 75-C, § 1º da CLT, que trata da necessidade de mútuo acordo entre as partes para a adoção do regime de teletrabalho, deve ocorrer de forma associada aos demais preceitos contidos no ordenamento jurídico pátrio, mormente aquele disposto no art. 187 do Código Civil, que proíbe o abuso de direito”, continuou.
Para o relator do acórdão, desembargador Wolney de Macedo Cordeiro, o posicionamento adotado pela decisão do juízo originário traz “fortes valores constitucionais protegidos pelo nosso ordenamento jurídico: proteção constitucional da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho; e isonomia, o qual busca assegurar iguais oportunidades às diversas pessoas, observada as diferenças existentes entre cada ser humano”.

E continua: “Uma negativa arbitrária na concessão do trabalho remoto, sem motivação minimamente razoável, diante da deficiência da reclamante, das dificuldades motoras, da acessibilidade precária do local de trabalho e dos riscos inerentes ao ambiente laboral não se mostra aceitável, trazendo em si um verdadeiro abuso de direito no poder diretivo patronal, bem como uma violação frontal à inclusão social do trabalhador deficiente, fundamentalmente tutelada pelo ordenamento jurídico”.

O que diz a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência
O desembargador Wolney de Macedo Cordeiro aplicou a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela ONU em 13 de dezembro de 2006, em assembleia que aconteceu em Nova Iorque. No Brasil, a lei foi promulgada em agosto de 2009.

Ele destacou a previsão normativa realizada pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada pelo Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, que assim dispõe sobre a facilitação e a viabilização do trabalho da pessoa portadora de necessidades especiais: “Artigo 27 Trabalho e emprego. 1 -Os Estados Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência ao trabalho, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. Esse direito abrange o direito à oportunidade de se manter com um trabalho de sua livre escolha ou aceitação no mercado laboral, em ambiente de trabalho que seja aberto, inclusivo e acessível a pessoas com deficiência. Os Estados Partes salvaguardarão e promoverão a realização do direito ao trabalho, inclusive daqueles que tiverem adquirido uma deficiência no emprego, adotando medidas apropriadas, incluídas na legislação, com o fim de, entre outros: […] b) Proteger os direitos das pessoas com deficiência, em condições de igualdade com as demais pessoas, às condições justas e favoráveis de trabalho, incluindo iguais oportunidades e igual remuneração por trabalho de igual valor, condições seguras e salubres de trabalho, além de reparação de injustiças e proteção contra o assédio no trabalho; […] i) Assegurar que adaptações razoáveis sejam feitas para pessoas com deficiência no local de trabalho”.

GISA VEIGA – ASCOM AMATRA 13