Direitos humanos precisam ser efetivados no mundo digital, aponta ministro Augusto César Leite

Jurista encerrou, juntamente com a jornalista Silvana Bahia, curso sobre aspectos materiais e processuais das plataformas digitais

30/11/2020 – Os direitos humanos são integrados, indivisíveis e equilibram as três dimensões do desenvolvimento sustentável: a econômica, a social e a ambiental. A análise é do ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Augusto César Leite de Carvalho, que encerrou, nesta segunda (30/11), o curso “Plataformas Digitais de Trabalho: Aspectos Materiais e Processuais”. Promovido pela Escola Nacional Associativa dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Enamatra), órgão de docência da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), o encerramento foi transmitido de forma simultânea e gratuita pelas redes sociais da Associação (FacebookInstagram e YouTube) e também contou com a participação da jornalista Silvana Bahia, mestre em Cultura e Territorialidades.

Na visão do ministro, apesar das experiências de governo colocarem em xeque as redes proteção internacionais de direitos humanos, a atitude dos operadores de Direito não pode ser de irresignação e historicismo. Para César Leite, há uma responsabilidade em torno da Agenda 2030 da ONU e dos objetivos de desenvolvimento sustentável, o que inclui a pretensão humanista com a efetividade dos direitos humanos. “É possível que tenhamos a esperança em um mundo digital no qual todos os direitos humanos sejam efetivos e no qual todas as nossas aspirações éticas se traduzam no princípio da solidariedade”, acredita o magistrado.

Para Augusto César, os avanços tecnológicos da atualidade não apenas mecanizam a produção industrial e automatizam a produção de bens em todos os setores, ganhando uma utilização massificada, passando, por exemplo, pelas empresas em redes, trabalhadores em plataformas e automação. “O avanço tecnológico de nossos dias é digital, ele rompe, gradualmente, as referências de tempo, de espaço de trabalho do sistema analógico de produção”, apontou, ao falar das consequências da tecnologia no monitoramento de dados, gerando práticas discriminatórias. “Há a vulneração de vários direitos, direitos de liberdade”, alertou.

A jornalista Silvana Bahia também falou da importância de se pensar na tecnologia com foco nos direitos humanos, o que deve incluir, em especial, a observância da diversidade. “A tecnologia vai mediar todas as relações de trabalho daqui para frente. O que muda quando uma mulher negra, uma pessoa trans, quando um homem negro ou uma mulher podem criar tecnologia? Quando a gente fala em diversidade é de uma forma muito mais ampla do que a questão de gênero e raça. É pensar na tecnologia pautada para uma diversidade social, territorial, econômica, etária porque são demarcadores sociais que atravessam a nossa experiência”.

As tecnologias não são neutras, segundo avaliação de Silvana Bahia. Segundo a jornalista, o racismo também está presente nas tecnologias e há, adverte, uma reprodução de preconceito através das tecnologias. “Uma câmera da Nikon, por exemplo, não reconhecia quando as pessoas asiáticas estavam com os olhos abertos. O Google foi outro exemplo de erro, quando na ferramenta de busca alguém digitava ‘gorilas’, fotos de pessoas negras eram exibidas. Isso nos faz pensar no quanto a gente acirra, aumenta as desigualdades e trabalha em cima de estereótipos”, analisou. Bahia também falou de pesquisa concluída pela Rede de Observatório de Segurança, que revelou que mais de 90% das prisões efetuadas por meio de reconhecimento facial são de pessoas negras e nem todas essas prisões estavam corretas. “Mas eram vistas como potenciais criminosos em razão do estereótipo que se tem do criminoso no país”.

O encerramento do curso foi mediado pelo diretor de Cidadania e Direitos Humanos da Anamatra, Marcus Barberino. O vice-presidente da Anamatra, Luiz Colussi, também acompanhou a programação. Ao abrir a programação, Barberino falou da trajetória dos direitos humanos não apenas no aspecto civilizatório, mas também histórica. “Os trabalhadores negros brasileiros não conheceram o mercado de trabalho estruturado antes da Constituição de 1988” apontou. “Eles foram libertados sem qualquer inclusão na sociabilidade capitalista”, analisou.