Cesar Zucatti Pritsch
Está muito na moda apontar os EUA como exemplo, dizendo que não precisamos de direitos trabalhistas nem de Justiça do Trabalho. Mas a Alemanha e a Inglaterra – outros países de capitalismo central e modelos econômicos bem sucedidos – também possuem uma Justiça especializada para as causas trabalhistas e vão muito bem, obrigado.
Na realidade, os EUA são um país com um sistema jurídico que é exceção no planeta, um ponto fora da curva, um país muito diferente para que possamos traçar uma comparação útil. Lá, a União pode legislar muito pouco (federalismo muito forte), existe relativamente pouca legislação federal, quase tudo é competência legislativa estadual (utilizam a Commerce Clause da Constituição para justificar, às vezes de forma até risível, o poder federal de legislar sobre um determinado tema).
Já os estados têm dificuldade de implementar direitos trabalhistas porque as indústrias migrariam para os estados onde há menos direitos (assim como aqui existe guerra tributária entre os estados, lá esse tipo de “guerra” legislativa também existe na esfera dos direitos trabalhistas, seara predominantemente estadual, inibindo a evolução de tais direitos).
Com um nível de direitos tão baixo (salvo onde haja competição por trabalhadores mais técnicos/especializados ou sindicatos fortes) o empregado comum fica em uma situação muito vulnerável. Se perder o emprego, pode cair na miséria rapidamente, exaurindo sua poupança em um ou dois meses, passando a viver do welfare ou social security, quando cabível.
Isso não chega a causar lá maiores problemas porque a economia dos EUA é a maior do mundo há quase um século, geralmente com pleno emprego. Os EUA se industrializaram logo depois da Inglaterra e largaram junto com a Alemanha na corrida pela hegemonia econômica mundial. Com as grandes guerras, as economias europeias destruídas ficaram para trás e os EUA dominaram.
Assim, essa comparação com os EUA, embora tentadora, é frágil porque compara alhos com bugalhos. Nossa legislação pode ter problemas (havia sindicatos demais, claro – mas o remédio foi amargo agora eles podem acabar de vez, pelo sufocamento financeiro, talvez não sobre nenhum).
Mas na maior parte, nossa legislação é similar à adotada na maior parte dos países desenvolvidos, seguindo os padrões da OIT (Alemanha e França, por exemplo). Boa parte das alegações repetidas 1000 vezes na mídia e redes sociais são incorretas. Tomemos cuidado para não acreditar em fake news.
Quanto à Justiça e o Direito do Trabalho do Brasil, são similares aos dos países europeus e demais países latino-americanos, nada havendo de “jabuticaba”, como repetidamente anunciam. Se querem melhorar o sistema, debatamos o remédio, sem matar o paciente, e sem comparar alhos com bugalhos.
CESAR ZUCATTI PRITSCH, Juiz do Trabalho no TRT4 e Juris Doctor pela Universidade Internacional da Flórida/EUA.